Mudar de vida II: Sintra

Sintra. Maravilhosa e misteriosa Sintra.

Dizem os mais velhos, os mais experientes, ou aquela entidade indefinida chamada “sociedade” que o voluntariado é para os mais novos, para os desocupados ou para “quem pode”. Como sou teimosa e não gosto que me digam o que posso ou não fazer, saí de um emprego estável aos 29 anos de idade para me aventurar durante uns meses neste mundo, onde damos mais do que recebemos, mas no final de contas recebemos muito mais do que aquilo damos.

E podia ter pedido melhor local para a minha primeira experiência de voluntariado ambiental de longa duração? Podem argumentar que sim, mas direi sempre convictamente que não.

Descobri a oportunidade por acaso, inscrevi-me num impulso e nunca me arrependi da decisão. Entre julho e agosto deste ano passei 7 semanas no coração da Serra de Sintra, no nosso Portugal, num projeto de Ambiente e Conservação da Natureza com a Associação Plantar uma Árvore, ao abrigo do programa Volunteer Escapes, onde cuidei de árvores e arbustos ainda muito pequeninos, plantados nos últimos anos. Para isso, era necessário fazer controlo de espécies de vegetação exótica invasora e de silvado, de forma a que as nossas espécies autóctones tivessem espaço para crescer e se afirmar. Paralelamente, trabalhei também na manutenção de percursos pedestres na Serra, na recuperação de linhas de água, na ajuda de coordenação de outras atividades de voluntariado e em ações de sensibilização junto dos turistas.

E sabem que mais? Adorei cada segundo! Se é fácil? Não, não é. Às vezes faz tanto frio que o corpo parece que gela outras, faz tanto calor que achamos que não vamos aguentar. O corpo ressente-se do esforço físico, as silvas arranham e os picos entranham-se na pele. Se isso me incomodava? Às vezes, quando o dia já ia longo. Se me demovia? Nem por um segundo.

Não. não vou dizer que é fácil. Mas para quem gosta, para quem sente o que está a fazer, é uma experiência incrível. E o bichinho, esse fica connosco mesmo depois do projeto acabar.


ALGUMAS DAS AÇÕES REALIZADAS DURANTE O PROJETO

Ação de sensibilização junto dos turistas

Durante o projeto, organizámos uma ação de recolha de beatas de cigarro nas áreas envolventes do Palácio da Pena e do Castelo dos Mouros, património sob a tutela da Parques de Sintra, parceiro do projecto. Em duas horas e meia, foram recolhidas 3200 beatas e lixo de outras tipologias.

O objetivo era contribuir para a mitigação de impactes ambientais por ação humana e sensibilizar as pessoas para esta problemática transversal a várias áreas: saúde, ambiente, educação, política e economia. Procurar soluções de sensibilização, recolha, reciclagem e transformação sustentáveis é uma necessidade, cada vez mais atual. As beatas concentram metais pesados e outras substâncias tóxicas e, dependendo das condições do local onde se encontram, decompõem-se lentamente e nunca na totalidade.

Apesar de ser humanamente impossível apanhar todas as beatas que estavam no chão, ao longo da ação de sensibilização conseguimos perceber pequenas mudanças de comportamento junto dos turistas, que nos abordavam e queriam saber mais sobre o que estávamos a fazer.

Recuperação de percursos pedestres

Um dia por semana era dedicado à recuperação e manutenção de trilhos. No período em que estive no projeto, o trilho intervencionado foi do Percurso de Seteais, que liga o Castelo dos Mouros e o Palácio da Pena ao Palácio de Seteais.

Os trabalhos passavam pela remoção de espécies exóticas, limpeza e demarcação dos trilhos, controlo de silvado, identificação de potenciais problemas de erosão do terreno e dificuldades do ponto de vista dos utilizadores.

Sei que a maior parte das pessoas que visitam o Palácio da Pena não se apercebem disto mas acreditem em mim, que vivi 30 segundos abaixo da Pena durante este tempo todo, é impossível abrir uma janela ou respirar profundamente na rua entre as 9h e as 19h devido ao trânsito caótico dos particulares que teimam em subir a serra, dos tuk tuk – que são só a coisa mais poluidora que já vi – e das centenas de autocarros diários, tudo a fazer ponto de embraiagem serra acima e serra abaixo, a poluir sonora e atmosfericamente um local que devia ser o mais puro possível.

Muito podia ser evitado se os turistas fossem informados dos inúmeros percursos pedestres que existem para visitar os principais monumentos de Sintra e se estes estivessem em boas condições de utilização. Lá chegaremos, um dia, já que a situação tal como está agora é totalmente insustentável.

Ação de voluntariado com jovens

Enquanto associação, a Plantar uma Árvore tem um papel muito ativo junto da comunidade. Para além das várias ações que fazem anualmente abertas ao público em geral, trabalham também com empresas e com entidades internacionais, através da organização de ações de voluntariado conjuntas.

Felizmente, tive a oportunidade de assistir e participar em duas delas. A primeira foi esta, uma iniciativa no Parque Natural de Sintra-Cascais, na área da Peninha, onde contámos com 56 jovens participantes oriundos dos Emirados Árabes Unidos em mobilidade de voluntariado em Portugal através da Campo Aventura. Com a ajuda deste grupo, demos continuidade aos trabalhos de manutenção de uma área plantada com tarefas diversas de limpeza de caldeiras, controlo de matos infestantes e proteção de regeneração espontânea.

A experiência foi enriquecedora a vários níveis, quanto mais não fosse por cada um dos voluntários ter estado responsável, sempre com a supervisão da equipa da Plantar uma Árvore, por 10 jovens e pelo seu trabalho durante toda a manhã. Acho que desafiante é dizer pouco: reter a atenção e motivação destes jovens não foi tarefa fácil, mas o balanço final foi muito positivo.

Ação de voluntariado aberta à comunidade

A segunda ação de voluntariado conjunta em que participei foi bastante diferente da primeira. Realizada também na área da Peninha (mas em locais diferentes do terreno),  contámos com cerca de 20 voluntários que deram continuidade aos trabalhos de preparação de terreno para novas plantações. O grupo era maduro, com muitos sócios da associação que já tinham bastante experiência neste tipo de ações.

A intervenção visou a recuperação de uma clareira ecologicamente degradada, numa ação promovida pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, contando com o apoio da Associação Plantar Uma Árvore, para a recuperação da vegetação endémica e o controlo de espécies exóticas infestantes.

Recolha de lixo

Infelizmente, em todas as parcelas que a Plantar uma Árvore geria na Serra de Sintra tínhamos um problema: o lixo. Lixo de quem ia passear, fazer uma caminhada, um piquenique ou, simplesmente, lixo atirado pela janela dos carros e deixado nas bermas da estrada.

Por conhecermos esta realidade, todos os dias no terreno fazíamos a recolha do lixo que encontrávamos na zona em que estávamos a trabalhar, que era posteriormente levado para o local adequado – lixo indiferenciado ou ecoponto.

Posso dizer que a coisa mais estranha que encontrei foi uma bandeja. Sapatilhas sem par era aos montes, pacotes de iogurtes e garrafas de plástico nem se fala…

As visitas

E de vez em quando, a meio do trabalho… percebia que tinha amigos novos 🙂

SOBRE O VOLUNTEER ESCAPES

O Volunteer Escapes (Volunteer with European Solidarity Corps for Activities in Portugal
with Ecological Sense) é um projeto LIFE pioneiro em Portugal, que pretende mobilizar voluntários para colaborarem em ações diversas de proteção da natureza, sobretudo em sítios da Rede Natura 2000. Envolve 11 parceiros nacionais e vai decorrer entre 2018 e 2020.

Eu estive a trabalhar diretamente com a Associação Plantar uma Árvore e, caso queiram saber mais sobre as oportunidades que eles têm em aberto, podem consultar aqui a informação. Se estiverem interessados em alguma das oportunidades da Plantar uma Árvore, podem falar diretamente com a Mariana Dias, que vos vai ajudar durante o processo todo. Caso queiram explorar as oportunidades dos outros parceiros do Volunteer Escapes, o melhor é mesmo seguirem a página do facebook do projeto e entrarem em contacto diretamente com eles.

Se faz parte dos vossos ter uma experiência de voluntariado ambiental não hesitem! Vão ver que vale a pena! 😉

E para acabar… Uma foto de grupo 😉

Na foto, os primeiros 4 voluntários da Plantar uma Árvore no Parque Natural Sintra Cascais. Da esquerda para a direita: Cristina Rodriguez, Bruno Saraiva, Leila Teixeira e Henrique Domingues. No final, Mariana Dias, da Plantar uma Árvore

Ficam a faltar a Maria João Parreira e o Miguel Teles, da Associação Plantar uma Árvore.

Obrigada pela experiência! Foi incrível!


Esta publicação foi a segunda de uma série de quatro, dedicada à minha mudança de vida e luta por aquilo em que acredito. Podem ver a primeira aqui e ficar a perceber como é que esta mudança se deu na minha vida.

 

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